domingo, 7 de dezembro de 2008

A estética da fome

“Um comportamento de um faminto é
tão absurdo que seu registro do real
cria o neo-surrealismo,
sua moral como sub-proletariado é mais
metafísica do que política.

Pergunte a Karl Marx sobre o destino do homem
força maior de ódio e guerra que consome,
no meio deste século em progresso
tristes desavisos sobre mares cinzentos.

As raízes índias e negras do
povo latino-americano
devem ser compreendidas como
única força desenvolvida deste continente.
Esta raça pobre e aparentemente sem destino
elabora na mística seu momento de liberdade”

Glauber Rocha-Bahia, Brasil, 1961.

A estética da fome foi escrita em consonância com um amplo debate acerca da libertação nacional dos povos colonizados na África.
O manifesto faz referência explícita à obra Os condenados da terra, de Franz Fanon,para quem a violência é o elo fundador do colonialismo.A violência sendo substrato da interação entre colonizador-colonizado seria também a expressão dialética da revolta do oprimido.
O confronto colonizado-colonizador se expressa pela força, dado que não há um solo cultural comum que intermédie o conflito.
Glauber e o Cinema Novo transpõem essa argumentação para o contexto brasileiro histórico, atribuindo-lhe um valor estético.
A violência enquanto estética valoriza uma linguagem que nega a cultura dominante.
Aí reside a trágica originalidade do Cinema Novo diante do cinema mundial: nossa originalidade é a nossa fome, nossa realidade social e política,e nossa maior miséria é que essa fome,sendo sentida não é compreendida.
A fome é sintoma da incivilidade instituída no campo oficial da política do subdesenvolvimento. Enquanto lamento bárbaro do oprimido,a fome é redenção,natureza bruta que explode em violência.
Lamento trágico que convertido em arte, potencializa a vocação libertaria de um povo.
A fome denuncia a miséria moral da burguesia, o personalismo populista dos políticos, exalta e atinge a piedade colonialista.
A fome é espelho do Terceiro Mundo, na contramão da história.
Potencialidade e primitivismo, estética da fome, natureza e cultura, transgressão e passividade-fome “embrião ético e estético da revolução”.

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